Banco Inter ganha reforço na briga pelas pequenas e médias empresas

São Paulo – O crescimento do banco Inter não pode ser medido apenas pelo comportamento das ações na bolsa, que já subiram 500% desde a abertura de capital, ou pelas 12 mil contas que são abertas diariamente de segunda a sexta-feira. O dinheiro aportado pelo fundo de investimento Softbank também é um bom indicador.

Em julho, a gestora japonesa comprou 8,1% da instituição mineira por 760 milhões e, passados dois meses, elevou sua fatia para 14,94% ao adquirir uma participação dos sócios Maria Fernanda e Rafael Menin, filhos do fundador do Inter e da construtora MRV, Rubens Menin. Se a operação tiver levado em conta o valor da unit na última sexta-feira (13), o desembolso do fundo japonês chegou a 928 milhões de reais. Com esse novo aporte, o fundo terá, entre outros direitos, a chance de indicar um membro para concorrer a um assento no conselho de administração.

Os investidores parecem ter gostado da novidade. Na segunda-feira (16), as ações e as units subiram 4,45% e 1,72%, respectivamente. Procurados, o banco e a gestora não concederam entrevista sobre o assunto.

Outro sinal do crescimento acelerado do Inter é a expansão imobiliária que o banco tem promovido no entorno de sua sede, no bairro Cidade Jardim, em Belo Horizonte. A instituição já ocupa quase dois quarteirões de casas, o que a diferencia de bancos tradicionais de varejo (com seus prédios espelhados) e de fintechs que dividem espaço em coworkings. Foi em um desses imóveis que João Vitor Menin, presidente do Inter, concedeu uma entrevista a EXAME há cerca de um mês. Na ocasião, o banco tinha feito um aumento de capital de 1,2 bilhão de reais.

“Depois dessa emissão, não teremos necessidade de nova oferta de ações nos próximos 18 meses, mas é claro que pode surgir uma oportunidade de comprar um banco XPTO daqui a um ano. Aí poderemos fazer um aumento de capital por causa de um evento que não estava previsto no crescimento orgânico da companhia. Mas fora um evento como esse — que eu acho muito difícil de acontecer, pois somos mais do crescimento orgânico do que da via de aquisição —, teremos um horizonte muito bom antes de termos uma nova diluição dos atuais acionistas”, disse.

A diluição acionária veio bem antes que o esperado por Menin, graças ao novo aporte do Softbank. Mas será que isso significa que o Inter estaria pronto para comprar o tal “banco XPTO”? Talvez, o foco não esteja em um banco e, sim, em uma credenciadora de cartões. Isso porque o Inter planeja lançar um modelo de adquirência pelo celular (sem maquininha) até a primeira quinzena de dezembro, de modo a aproveitar as vendas de Natal. Com isso, vai entrar numa guerra de gigantes com Cielo, Rede, GetNet, Stone e PagSeguro.

“Estamos estudando até que ponto vale a pena ter uma adquirência própria ou fazer uma joint venture (parceria) com uma já existente. Pode até ser que nasça como uma JV e depois vire uma fusão ou aquisição (M&A na sigla em inglês)”, afirmou Menin. “Nos últimos oito a dez meses, analisamos empresas do mercado, o valor de cada uma delas, como poderiam compor com o Inter e quais delas compartilham o mesmo foco no cliente. Afunilamos para duas possibilidades, e acho que vamos decidir isso nos próximos 45 a 60 dias”, completou (ou seja, nos próximos 15 ou 30 dias).

A ideia é oferecer uma taxa mais competitiva para os clientes ao tirar “a ineficiência da maquininha”. “A equação da taxa não é só derivada do custo da maquininha. Tem outros componentes, como o custo de funding (captação de dinheiro) que, no nosso caso, é muito baixo. Com o baixo custo de funding e eficiência da operação tecnológica, a gente acha que terá uma proposta de valor que será muito pela experiência e pelo preço”, disse.

A entrada nessa seara é importante especialmente agora que o banco está se dedicando mais às pequenas e médias empresas. “A ideia é cauda longa, não queremos fazer diferença para o Pão de Açúcar, Magazine Luiza ou Carrefour. A gente quer o cliente que tem uma padaria, um açougue, uma banca de jornais ou vende milho na praia. É outro jogo.” Veja a seguir outros trechos da entrevista concedida em agosto.

O interesse pela adquirência é reflexo de um movimento em busca de uma fatia maior de empresas como clientes?

Quando lá atrás falamos “vamos lançar um banco de varejo”, nos perguntamos onde iríamos atacar primeiro e escolhemos a pessoa física. É um mercado maior e já estávamos mais preparados, pois tínhamos a nossa conta corrente voltada para esse público. Desde que começamos a abrir contas digitais em 2016, fizemos diversas melhorias no produto para que ficasse completo do jeito que é hoje com investimentos, seguros, pagamentos, depósito de cheque por imagem, recarga de celular. Há uns dez meses, a gente falou “putz, tem outro mercado que, por razões óbvias, a gente deixou de lado: as empresas”. Já temos o produto e sabemos que a experiência não é boa, tampouco a gama de produtos. Vamos melhorar a experiência do on-boarding, as funcionalidades, as ofertas e tipos de serviços. A adquirência é importante para pessoa jurídica, assim como o débito direto autorizado (DDA). Por isso, estamos estudando. Fato é que, se para a pessoa física a proposta dos bancos era ruim, para os PJs era pior ainda.

O peso da carteira de pessoas jurídicas deve ultrapassar o de pessoas físicas?

Acho que ultrapassar não, mas vai ser muito importante para nos ajudar a aumentar o número de clientes, receita, rentabilidade. Até porque PF e PJ se confundem, né? O dono da padaria pode ter duas contas, uma como pessoa física e outra como jurídica. Temos que ter essa proposta.

Isso significa um aumento da concessão de crédito?

Nós estamos crescendo muito em produtos que a gente tem conforto com relação à inadimplência. Não adianta crescer muito e depois perder tudo. Seria o caos, terrível. Por isso, a gente vê com bons olhos os produtos colateralizados (com garantia). É o caso do home equity e do consignado. Já no caso do cartão de crédito é um jogo de cachorro correndo atrás do rabo, pois, por algum motivo, aquela pessoa não tem consignado público nem privado, não tem casa própria. Está fazendo consumo e não tem outro colateral, como investimento. Nesse sentido, é muito difícil que tenha boa capacidade de pagamento, por isso a expectativa é que o nível de inadimplência dela seja alto. O que os bancos fazem (nós também mas em menor escala): concedem o cartão de crédito, porque faz parte do portfólio das pessoas, e aumentam a taxa de rotativo. Outro dia, tivemos uma reunião com Roberto Campos, presidente do Banco Central, e ele disse que a coisa que mais o incomoda é que o Brasil agora tem juros de primeiro mundo — estamos com a Selic indo para 5% e com inflação de 2,5%, então, o juro real é de 2% — e tem cartão com taxa de quase 1000% ao ano. Acabar com isso é uma das bandeiras dele juntamente com o tal do “raspa conta”, que é aquele fundo que cobra 4% do CDI. Ele também quer impulsionar o home equity.

Existe uma receita para ter um cartão de crédito mais barato?

A nossa taxa é altíssima, de  7,5% ao mês. A saída é darmos uma chance para a pessoa provar o comportamento, o tal behaviour. Por isso, vamos ser mais lentos na concessão de cartão, pois não queremos dar cartão para todo mundo como o Nubank. Cada um tem a sua estratégia, e eles escolheram dar crédito para criar uma base, mesmo que tenham perdas. Bom, não é a nossa pegada. Como a gente pode ajudar a colateralizar isso? Com um super aplicativo (app). Se a pessoa compra com cartão dentro do nosso marketplace, eu recebo um take rate (porcentagem do quanto o banco ganha sobre cada transação) de 5% a 15%. Esse valor pode ser o colateral. Assim, posso ter taxa de 7,5%, 5%, 6% ou até 4%. Se somarmos o behaviour, mais o tempo que a pessoa é nossa cliente, mais o cadastro positivo, por que não podemos ter uma taxa de 4% ao mês?

Essa é a única vantagem de oferecer um super aplicativo?

Se já temos o crédito e o serviço de pagamento dentro de casa, por que não oferecer serviços não-financeiros em um aplicativo só? Em alguns lugares do mundo isso funciona muito bem, pois significa comodidade. Se tivéssemos 50% dos clientes indo à agência, então, só teríamos 50% para aproveitar. Mas nosso caso é 100% digital, o que significa que todos são elegíveis a serem usuários do super app. Estamos com a faca e o queijo na mão. A gente tem uma proxy que mostra que isso funciona: é o caso da plataforma aberta de investimentos (PAI), que é um marketplace de investimentos. A gente recebe um take rate, que é o rebate dos fundos, e divide com os clientes. Vamos seguir nesse caminho. Se não formos nessa direção, ficaremos com um projeto manco, do mesmo jeito que um e-commerce ou marketplace que não tem serviços financeiros. Foi por isso que um Mercado Livre criou o Mercado Pago.

Ou seja, existe a chance de que a concorrência com novos bancos digitais aumente nos próximos anos?

Outro dia me falaram assim “muito legal esse negócio de banco, não tem barreira de entrada”. Olha, não é bem assim. Vamos colocar os pingos nos is. Tem muita barreira. Uma coisa é montar um arranjo de pagamento, uma fintech. Outra coisa é montar um banco digital. Você sabe que a gente roda umas 300 rotinas todas as noites para ter certeza de que o investimento do cliente está certo? Não são tantos bancos digitais.

O Nubank é?

Não. A conta dele é de arranjo de pagamento, não tem investimentos, não tem crédito — tem cartão de crédito. Tem todos os méritos, mas não é banco. Já o banco Original é um banco digital, não tão completo quanto a gente, mas é. O Next é um banco digital. O PagBank não é, é um arranjo de pagamento, é uma fintech. Então, não tem tantos bancos digitais assim. “Ah, tal varejista está lançando um banco”, não está. É um arranjo de pagamento. E isso é importante para o benefício do próprio cliente. O dinheiro que fica ali na conta é esterilizado no Banco Central. Tanto é que, quando teve aquele problema do banco Neon, por que os clientes não perderam dinheiro? Porque o dinheiro não estava no banco que sofreu intervenção. Estava no BC.

Em meio a essa infinidade de bancos e arranjos de pagamento, como ganhar da concorrência?

Na nossa visão, a guerra será vencida pela plataforma que tiver a maior cobertura de serviços. Imagine que você tenha uma conta da XP para investir, mas para pagar o boleto do colégio do filho tem que abrir o aplicativo do Itaú, do Bradesco ou do próprio Inter. Já se quiser usar o cartão, tem que pegar o do Nubank. Não dá. A estratégia vencedora no médio e no longo prazo é aquela que oferecer uma experiência única, com dados concentrados e acesso às melhores ofertas de todos os serviços. A gente tem tentado se diferenciar pela oferta de produtos. Não só pela quantidade de produtos, mas também pela precificação, a conta gratuita, o consignado mais barato, o rotativo mais barato.

Mas não faz muito tempo que o aplicativo de vocês passou por uma certa instabilidade…

Quando você junta tudo em um único aplicativo, a estabilidade passa a ser um desafio enorme. Modéstia parte, temos entregado um aplicativo super estável. Mas erros vão acontecer. A gente vai errar, o Itaú vai errar, o Bradesco vai errar, o WhatsApp vai errar. Só não pode errar sempre e precisa consertar o mais rápido possível para que o impacto seja pequeno, quase assintomático. Por isso, a gente investe muito na estrutura de tecnologia da informação. Por incrível que pareça, os sistemas dos grandes bancos não são tão avançados, porque são uma junção de sistemas de vários bancos que foram adquiridos. O nosso é mais leve. Isso é uma vantagem. Por que a Caixa tem 11 aplicativos? Por que ela quer? Não, porque ela precisa, porque as coisas não conversam entre si. Eu faço analogia com aviação. Você está em um avião que teve uma pane, e o voo atrasa meia hora. Ok. Ou está num voo e o piloto erra e teve que arremeter. Ok também. O que não dá é para um avião cair a cada seis meses. Então, se o aplicativo sair do ar por alguns minutos, ok; se o aplicativo não atualizar o valor do investimento do cara, ok. É claro que a gente não quer que isso aconteça, mas isso passa. O que a gente quer é zelar pelo patrimônio da pessoa que está com a gente.

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