Caixas de autoatendimento nos supermercados da França geram preocupação

França – Em uma tarde de domingo, os clientes em um supermercado Géant Casino andavam pelos corredores e faziam fila para comprar carne, peixe e outros artigos. Era uma típica experiência de compra, exceto por uma coisa: todos os funcionários dos caixas tinham ido para casa. Os clientes passavam seus itens pelos caixas de autoatendimento enquanto guardas de segurança andavam pelas proximidades.

O fato de a loja estar aberta era incomum. As leis trabalhistas francesas proíbem que a maioria delas tenha funcionários após as 13h aos domingos. Mas, com o comércio eletrônico e gigantes on-line como a Amazon inaugurando uma era de gastos 24 horas por dia, os varejistas estão ampliando o uso de caixas de autoatendimento para ajudá-los a competir.

A mudança causou clamor na França, onde os domingos são tradicionalmente um dia de descanso para trabalhadores e famílias. Embora os caixas de autoatendimento sejam frequentemente usados ao lado dos caixas normais, os sindicatos dizem que a adoção de operações totalmente sem funcionários ameaça o modo de vida francês, incentivando o consumismo e a automação ao estilo americano, colocando milhares de empregos em risco.

“Os domingos são sagrados. Se mudarem isso, vão mudar a sociedade francesa. E se os caixas de autoatendimento se tornarem algo normal, isso terá um impacto catastrófico sobre os trabalhadores”, disse Patrice Auvinet, chefe da Confederação Geral do Sindicato dos Trabalhadores em Angers, cidade de médio porte no oeste da França.

O Groupe Casino, o maior operador de supermercados do país, começou o teste de abrir no domingo à tarde em agosto usando apenas caixas de autoatendimento no grande supermercado em Angers. A empresa expandiu o experimento para pelo menos 20 outras megalojas em todo o país, gerando protestos.

O presidente Emmanuel Macron facilitou a abertura aos domingos em 2015, quando era ministro da Economia da França, afrouxando a regulamentação do horário comercial em torno de Paris e de outras áreas turísticas para estimular a economia. Os sindicatos lutaram contra as medidas, citando os direitos trabalhistas conquistados ao longo de décadas.

Mas os varejistas dizem que as restrições aplicadas fora do centro das cidades se tornaram um empecilho, pois o e-commerce conturba o cenário do varejo. Conforme as lojas físicas vão perdendo vendas para comerciantes on-line, as empresas dizem que é preciso competir ou perecer.

“O mundo está mudando e estamos em um ambiente muito competitivo. A internet não tem fronteiras, por isso precisamos nos adaptar aos novos modos de consumo que nos permitem permanecer no jogo e ser vencedores”, disse Sébastien Corrado, diretor de marketing do Groupe Casino.

Aumentar o lucro é especialmente importante para o Groupe Casino, que também opera supermercados na América do Sul e na Ásia, e que está reestruturando bilhões de euros de dívida depois que suas holdings entraram recentemente em uma forma de proteção contra falência.

Na loja de Angers, que emprega 115 pessoas em um bairro da classe trabalhadora, os funcionários do Groupe Casino deixam o trabalho como de costume às 12h30 aos domingos; então, chegam os guardas de segurança, contratados por outra empresa, para manter a loja aberta até a noite.

O Groupe Casino estava operando 130 lojas menores em Paris e outras cidades usando caixas de autoatendimento para permitir que os consumidores fizessem compras até a meia-noite ou mesmo 24 horas por dia.

Mas os maiores supermercados do grupo, como o de Angers, empregam milhares de pessoas, muitas vezes na periferia urbana, onde oportunidades de emprego são limitadas. Naquela primeira tarde de domingo, em agosto, 200 manifestantes seguiram para a loja de Angers, cantando revoltados e acusando a empresa de dar um grande passo para substituir os funcionários.

“Hoje é apenas o começo, mas amanhã quem pode dizer que isso não vai parar?”, questionou Xavier Roche, funcionário de manutenção de outra grande cadeia de supermercados, o Carrefour, que se juntou aos protestos.

Ele está preocupado com o fato de que o Carrefour, que usa caixas de autoatendimento em suas lojas de conveniência para ficar aberto aos domingos, fará o mesmo nas maiores. “Primeiro são as tardes de domingo, depois serão 24 horas por dia”, disse Roche.

Supermercados sem funcionários nos caixas estão ganhando terreno em todo o mundo. Reduzir os pagamentos em dinheiro e o tempo do processo de compra se tornaram grandes metas para os varejistas que querem tornar a experiência mais rápida e atraente, diminuindo os custos trabalhistas.

A Amazon forçou os limites ao abrir o Amazon Go nos Estados Unidos, um minimercado em que os clientes podem comprar itens sem qualquer interação humana. A Tesco está testando lojas sem funcionários nos caixas no Reino Unido.

Lojas na China estão usando cada vez mais os pagamentos por reconhecimento facial, o que permite que os compradores paguem olhando para uma câmera, depois de terem vinculado uma foto de seu rosto a uma conta bancária. Esta tecnologia elimina a necessidade de uma carteira ou de um aplicativo móvel.

O Groupe Casino não foi tão longe. Mas está chegando lá. Em 2018, abriu uma loja gastronômica na Champs-Élysées, em Paris, que permite a compra de tudo, desde flores até foie gras, usando um aplicativo para digitalizar os produtos e pagar.

As telas interativas mostram dados sobre a composição, o preço e a popularidade de um produto. Para os compradores que não conseguem encontrar o queijo, uma tela de informações ativada por voz dá instruções para o corredor certo. Há cerca de uma dúzia de funcionários que ajudam os clientes e reabastecem as prateleiras, mas não há ninguém nos caixas.

Os clientes com maior intimidade com a tecnologia e pressionados pelo tempo rapidamente adotaram esses serviços. “Estamos atendendo às necessidades de nossos clientes. Se não tivermos de fechar, então todos ganham, porque as pessoas obtêm comodidade e nossas vendas aumentam. Isso também beneficia nossos funcionários”, disse Corrado, o diretor de marketing.

Para os trabalhadores, é difícil acreditar nisso, pois eles temem que a abertura durante toda a noite em pequenas lojas, quanto mais nas tardes de domingo nos grandes supermercados, seja o início da rápida automação completa e dos empregos perdidos.

Saliha Guechaichia, de 47 anos, ficou ansiosa quando o Cassino Géant abriu naquela primeira tarde de domingo sem ela e as outras pessoas que trabalham no caixa, muitas delas mães solteiras com filhos. Ela começou a trabalhar no Casino há 30 anos, ganhando um salário modesto para garantir sua subsistência e a de sua família.

“Costumava haver 22 caixas com funcionários – agora há apenas 13”, disse Guechaichia, que é filiada ao sindicato, enquanto se sentava um café em frente à loja com um grupo de funcionários preocupados. Oito caixas de autoatendimento foram instalados recentemente, disse ela, e mais estão chegando. “Estamos preocupados. Isso não é um teste – as máquinas vieram para ficar.”

Os trabalhadores mais jovens acham mais fácil se adaptar. “As máquinas não podem nos substituir completamente. Por exemplo, somos treinados para reconhecer quando alguém pode estar roubando. Uma máquina não consegue fazer isso”, disse Arthur Hornoy, de 20 anos, estudante universitário que trabalha meio período como caixa para ajudar a pagar seus estudos.

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