Carteira perdida com dinheiro tem chance maior de ser devolvida

Por Reinaldo José Lopes

Depois de perder (de propósito) 17 mil carteiras em 40 países diferentes, pesquisadores dos EUA e da Suíça chegaram à conclusão de que as pessoas são mais honestas do que se costuma imaginar.

Ocorre que a presença de dinheiro nas tais carteiras aumentou a probabilidade de que elas fossem devolvidas, aponta o estudo da equipe, publicado na revista Science. E, quando a quantia em questão era relativamente alta, a chance de devolução era maior do que quando a carteira continha apenas uns trocados.

Os resultados, analisados por Alain Cohn, da Universidade de Michigan, David Tannenbaum, da Universidade de Utah, e Michel Maréchal, da Universidade de Zurique, fortalecem a ideia de que, apesar de tudo, seres humanos estão longe de se comportar como máquinas de sobrevivência egoístas. Em média, as pessoas tendem a se preocupar com os outros, mesmo quando são ilustres desconhecidos, e a agir de forma justa.

Essa constatação vai contra modelos tradicionais do comportamento econômico, que costumavam se basear na ideia de que o importante são os interesses racionais de cada um. Ou seja, as pessoas tenderiam a agir em benefício próprio e, quanto maior o incentivo financeiro, maior a tentação de embolsar o dinheiro, independentemente das consequências para os demais.

Os autores tentaram colocar essa visão à prova controlando o conteúdo da carteira supostamente perdida. O objeto era transparente e continha uma lista de compras, uma chave e um cartão de visitas (com o nome, a profissão e o email do dono). Além disso, podia ou não vir com dinheiro, um valor em torno de US$ 13 (uns R$ 50; a quantia foi ajustada de acordo com o poder de compra do país).

Os assistentes dos pesquisadores, então, visitaram cidades dos 40 países, com pelo menos 100 mil habitantes cada uma, e, como quem não quer nada, apareciam com as carteiras no balcão de atendimento de locais como museus, bancos, tribunais etc. Diziam ao atendente que tinham achado a carteira numa rua próxima e pediam que ele entrasse em contato com o dono para devolvê-la.

Em casos em que o acessório “perdido” não continha dinheiro, o atendente entrava em contato com o suposto dono 40% das vezes, em média. Mas, quando havia, a proporção subia para 51%. Em lugares em que há pouca corrupção e índices elevados de confiança entre as pessoas, como países escandinavos, Suíça e Holanda, aconteceram mais tentativas de devolução.

(Caso você esteja preocupado com o desempenho brasileiro, os “donos” das 400 carteiras deixadas em cidades como São Paulo, Rio, Curitiba e Manaus foram contatados com uma frequência similar à da média mundial. Os números do país não são muito diferentes dos de Grécia, Itália, Portugal e EUA.)

Intrigados com o resultado, os pesquisadores refizeram o teste no Reino Unido, na Polônia e nos EUA, desta vez colocando, em algumas carteiras, o equivalente a US$ 95, ou R$ 370. Nesses casos, apelidados por eles de variante BigMoney (“Muita Grana”), as tentativas de devolução pularam para 72%. Outro detalhe é que a presença das chaves também incentivava a devolução, tornando-as 10% mais comuns do que em casos em que ela não estava entre os itens.

Por que diabos as pessoas estariam se comportando desse jeito? Em parte, os dados acerca das chaves sugerem que existe a preocupação genuína em devolver algo que pode fazer falta. Mas os pesquisadores suspeitavam que, no caso do dinheiro, existe também a preocupação com a autoimagem do atendente, que não quer sentir que está agindo feito ladrão.

Foi o que eles constataram, ao fazer uma pesquisa de opinião com mais de 2.000 britânicos, americanos e poloneses. Eles disseram que se sentiriam como ladrões com intensidade cada vez maior caso a carteira contivesse dinheiro e, pior ainda, uma quantia relativamente alta, e ainda assim não a devolvessem.

Ou seja, tudo indica que, em vez de ficar pensando apenas na relação custo-benefício, a maioria das pessoas leva em conta suas emoções sobre o certo e o errado, e os possíveis sentimentos da pessoa que perdeu a carteira na hora de decidir o que fazer.

“Às vezes até os especialistas tendem a ser pessimistas demais em relação às motivações das pessoas em contextos como esse”, disse Maréchal em entrevista coletiva por telefone. “Talvez pequenas mudanças nos ambientes em que vivemos, que ajudem a recordar esse impulso emocional, sejam um jeito barato de levar as pessoas a agirem de modo mais honesto.”

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