COP26: 18 grandes nomes falam de suas expectativas para o evento

Está perto de terminar a contagem regressiva: no último dia deste mês será aberta em Glasgow, na Escócia, a 26ª conferência do clima da ONU, a COP26. Serão 12 dias de intensos debates e negociações determinantes para o futuro do planeta.

Governos de quase 200 países estarão ao lado de integrantes de diversas áreas da ciência, da economia e da sociedade para analisar o que foi feito globalmente para conter as mudanças climáticas, desde o Acordo de Paris, em 2015, além de revisar os mecanismos de atuação e traçar novas – e urgentes – ações para os próximos anos. 

Para ter um panorama das questões mais aguardadas do encontro mundial, 18 especialistas e lideranças compartilharam com EXAME as suas maiores expectativas:

Carlo Pereira, diretor executivo da Rede Brasil do Pacto Global da ONU

Carlo Pereira, diretor executivo da Rede Brasil do Pacto Global da ONU (Fellipe Abreu/Divulgação)

“Espero que o governo brasileiro apresente compromissos sólidos. Já há algumas críticas ao que foi apresentado, mas aguardo algo novo e mais completo. Outra expectativa é que mais empresas assumam metas efetivas, consistentes e ambiciosas. A sociedade civil também vai levantar temas importantes, como as queimadas, da mesma forma que a academia, que tem feito grandes estudos. Apesar de a COP26 ser um espaço de negociação, como o secretário-geral António Guterres sempre diz, a negociação já foi, agora é hora de todo mundo mostrar a que veio. A gente tem visto que as coisas estão acontecendo, como o Summit liderado pelo Biden e a China avisando que não vai financiar usinas a carvão, mas esperamos ainda mais. E temos que falar sobre o Artigo 6, sobre o financiamento dessa coisa toda. É um tema muito importante. Será a grande negociação que vai ter nessa COP26, além da criação de um novo mecanismo de mercado para o carbono. São todas coisas objetivas. Complicadas, mas objetivas.”


Davi Bomtempo, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI)

Davi Bomtempo, gerente-executivo de Meio Ambiente e Sustentabilidade da Confederação Nacional da Indústria (CNI) (CNI/Divulgação)

“A agenda do clima é uma grande oportunidade para o Brasil, que, além das vantagens naturais, possui uma indústria comprometida com o desenvolvimento sustentável. O setor irá à COP-26 apresentar suas experiências bem-sucedidas no uso eficiente de recursos naturais e na redução de emissões. O mundo cobra do Brasil responsabilidade ambiental, e o setor privado tem interesse em se manter alinhado com os acordos internacionais. Além disso, estamos na expectativa sobre a definição das regras para o mercado global de carbono, imprescindível para o cumprimento das metas do Acordo de Paris. Com regras justas e transparentes e, se bem operado, esse mecanismo propiciará novos negócios, investimentos e transferência de tecnologia para o Brasil.”


Marcos Jank, professor sênior de agronegócio no Insper e coordenador do centro Insper Agro Global

Marcos Jank, professor sênior de agronegócio no Insper e coordenador do centro Insper Agro Global (Insper/Divulgação)

“Nessa COP, veremos uma discussão muito intensa sobre os compromissos assumidos pelos países na redução de emissões. Agora, particularmente, EUA, Europa e China estão alinhados nessa tarefa. Espera-se que outros países também façam o mesmo. Nesse momento, há países muito importantes que ainda não disseram o que vão fazer, como Indonésia, Rússia, Austrália, México, Japão e Brasil. Então é fundamental que essa discussão aconteça. E ela vai produzir muito mais ambição do que foi visto desde o Acordo de Paris. Outra coisa importante é a regulamentação do mercado de carbono, que é um mercado global com imenso potencial. Fala-se que esse comércio de créditos de carbono pode atingir entre 60 e 160 bilhões de dólares e, obviamente, é muito interessante para o Brasil, já que somos uma grande potência agroambiental.”


Denise Hills, diretora de sustentabilidade de Natura & Co América Latina

Denise Hills, diretora de sustentabilidade de Natura & Co América Latina (Roberto Setton/Divulgação)

“Os planos climáticos podem e precisam ser mais ambiciosos e a ação em torno disso deve vir de forma coletiva e global. A COP-26 é um momento-chave para chegarmos a um amplo compromisso para a descarbonização da economia. Defendemos que os mecanismos do mercado de carbono fortaleçam prioritariamente a conservação de biomas e a proteção de sua sociobiodiversidade nos termos do artigo 6 do Acordo de Paris. É preciso desenvolver mecanismos de valoração e mercado que sejam justos em relação à desigualdade das populações tradicionais e pequenos produtores, sobretudo na América Latina, além de priorizar projetos de compensação oriundos de Soluções baseadas na Natureza (NbS). A regeneração e a aceleração de modelos de negócio e investimentos que escalem a transição para uma economia da sociobiodiversidade pode ser uma das maneiras mais eficazes de enfrentar a crise climática e gerar um valor de negócios, renda e atração de investimentos. Uma oportunidade, sem dúvida, para o Brasil na agenda da COP26.”


Natalie Unterstell, presidente da Talanoa e membro do Painel de Acreditação do Green Climate Fund

Natalie Unterstell, presidente da Talanoa e membro do Painel de Acreditação do Green Climate Fund (Talanoa/Divulgação)

“A COP26 é sobre ambição, ambição e ambição. O mundo todo sabe que não podemos ultrapassar os 2 graus de aquecimento até o fim do século – porém, segundo cálculo recente da ONU, as metas dos países nos levam hoje a 2.7 graus de aumento. Precisamos de muito mais compromissos políticos, até porque a transição na economia real está se dando de forma rápida. Os governos precisam refletir isso nas suas políticas. O Brasil está sem ambição: a meta (NDC) proposta pelo governo em 2020 permite que a gente chegue em 2030 com desmatamento mais alto do que hoje. Não adianta apresentar plano para implementar esse compromisso se ele nos coloca na rota errada. Quem vai querer investir nisso? Um assunto-chave das negociações é a regulamentação dos diferentes tipos de mercado de carbono, por meio do artigo 6 do Acordo de Paris. Esse é um tema bastante relevante para o Brasil, que pode tanto vir a ofertar créditos quanto ter que comprá-los, caso não cumpra suas metas”.


Guarany Osório, coordenador do Programa de Política e Economia Ambiental do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV

Guarany Osório, coordenador do Programa de Política e Economia Ambiental do Centro de Estudos em Sustentabilidade da FGV (FGV/Divulgação)

“A meu ver, um ponto que demanda solução é a regulamentação do artigo 6 do Acordo de Paris que dispõe sobre o financiamento para cooperação internacional. O artigo 6.2 refere-se ao mecanismo de mercado do tipo bottom-up (países definem regras sob orientação da ONU) e pode ajudar no desenvolvimento e na integração de mercados de carbonos regulados entre diferentes países. O artigo 6.4 versa sobre um mecanismo top-down (ONU define regras), baseado em projetos de redução de emissões que podem gerar créditos de carbono para serem transacionados entre países. Nesse debate, é importante ficar atento para o desenrolar da discussão sobre como evitar dupla contagem de emissões ou créditos transacionados. Ou seja, quem compra deduz as reduções de emissões adquiridas de sua meta e quem vende não as contabiliza em sua meta para evitar a dupla contagem.”


Gilberto Tomazoni; Presidente JBS Gilberto Tomazoni, CEO Global da JBS

Gilberto Tomazoni, CEO Global da JBS (Germano Lüders/Exame)

“A COP26 precisa observar o que o setor privado brasileiro já vem fazendo diante da crise climática e dar voz aos nossos produtores, que têm papel fundamental a desempenhar contra o aquecimento global. Já existem soluções no campo para ampliar a produção, ao mesmo tempo em que se realiza o sequestro de carbono. Temos de dar escala a essas iniciativas e investir em novas tecnologias para superar os obstáculos ainda existentes. Por isso, esse tema precisa fazer parte da conferência climática, para compartilharmos aprendizados e garantirmos que os pequenos produtores não fiquem para trás”.


Carolina Genin, diretora de Clima do WRI Brasil

Carolina Genin, diretora de Clima do WRI Brasil (WRI/Divulgação)

“Espero que o governo brasileiro coloque em prática ações para retomar a liderança ambiental que já exerceu em outras COPs. Caso contrário, isso terá um peso negativo sobre o país na próxima década, pois perderemos oportunidades econômicas, inclusive para setores críticos como infraestrutura e agricultura. Ao mesmo tempo, governadores, empresários e sociedade civil estão com pautas na COP26 e a expectativa é de que mostrem o comprometimento do Brasil com o enfrentamento da emergência climática, com a retomada econômica verde, justa e resiliente, e principalmente com o desmatamento zero.”


Isabel Garcia Drigo, Gerente de Clima e Emissões do Imaflora

Isabel Garcia Drigo, Gerente de Clima e Emissões do Imaflora (Imaflora/Divulgação)

“A grande expectativa da COP26 é o que faremos a partir do dia seguinte ao término da conferência para acelerar, globalmente, a transição da economia intensa de carbono que temos hoje para uma economia de baixo carbono. Precisamos delinear caminhos muito concretos para acelerar realmente esse processo. Precisamos entender, por exemplo, se vamos avançar, com regras claras, para um mercado de carbono global. Ou se os incentivos para deixar de gerar emissões de carbono por meio de combustíveis fósseis vão vir dos países que ainda usam esses recursos. É necessário um aumento na ambição dos compromissos que levarão ao desmatamento zero e das NDCs de cada país, bem como entender se teremos sistemas de monitoramento do progresso das NDCs com uma agenda de implementação. Para nós, do Brasil, devemos sair com uma maior clareza das soluções para os setores que usam a terra, principalmente o agropecuário. O setor tem a oportunidade de avançar na redução das emissões e demonstrar isso para o resto do mundo.”


 (Unilever/Divulgação)

“Para a COP26, espero que três grandes resultados sejam alcançados. O mais importante é que todos os países membros se comprometam com Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDC) mais ambiciosas, a exemplo do Reino Unido, que antecipou o net zero para 2045. Com o crescimento de impactados pelas mudanças climáticas, é fundamental que se aprofunde o tema de adaptação para fortalecer as resiliências nas regiões mais vulneráveis. É necessário ampliar o acesso ao financiamento para a transição para uma economia de baixo carbono nos países de menor desenvolvimento relativo. A regulamentação do artigo 6, com mecanismos de mercado, estimulará a contribuição global do setor privado para o alcance das metas. Considerando as responsabilidades históricas e as emissões atuais, urge um plano de recuperação justo e resiliente, para reduzir emissões pelo uso da terra, incentivando a agricultura de baixo carbono e redução de desmatamento. Em energia, é importante e urgente interromper incentivos públicos e subsídios para fontes de energia não renováveis, para agilizar energias renováveis. Por fim, reforçar a importância das soluções baseadas na natureza, com políticas que estimulem economia regenerativa para a restauração de ecossistemas naturais degradados e revertam a perda de biodiversidade global”.


José Eli da Veiga, economista, autor e professor sênior do Instituto de Estudos Avançados da USP

José Eli da Veiga, economista, autor e professor sênior do Instituto de Estudos Avançados da USP (Leonor Calasans/IEA-USP/Divulgação)

“Se a China surpreender, poderá surgir algum avanço. Se não, minha expectativa é nula.”


Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS)

Marina Grossi, presidente do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS) (CEBDS/Divulgação)

“O momento atual é de emergência climática, não há mais espaço para intenções. Chegou, definitivamente, o momento de agir. O Brasil tem um papel de liderança a exercer para conseguirmos chegar a emissões líquidas zero globalmente em 2050 e para cortarmos pela metade as emissões até 2030. O setor empresarial brasileiro tem feito a sua parte, adotando ações corporativas concretas, como o preço interno de carbono e as metas de neutralização. Assim como está liderando iniciativas de políticas climáticas públicas com instrumentos de mercado e inclusão social. A COP 26 será uma oportunidade para as empresas compartilharem esse comprometimento e reforçarem nosso engajamento mundial.”


Cristiano Teixeira, diretor-geral da Klabin

Cristiano Teixeira, diretor-geral da Klabin (Klabin/Divulgação)

“A COP-26 será um momento crucial dos governos, setor privado e sociedade civil trabalharem de maneira integrada, buscando ações efetivas e acordos que beneficiem o planeta como um todo. Precisamos agir para implementarmos um robusto plano de descarbonização, que passa pelo investimento em tecnologias de baixo carbono e pela redução urgente do desmatamento ilegal, para então avançarmos em questões práticas, como a entrega de um acordo para se criar um mercado global de carbono. É fundamental potencializarmos as ações para que as mudanças climáticas ganhem cada vez mais espaço nas estratégias corporativas, engajando o máximo possível de empresas para o net zero.”


Edis Milaré, professor e consultor em Direito Ambiental

Edis Milaré, professor e consultor em Direito Ambiental (Divulgação/Divulgação)

“Do ponto de vista do Direito Internacional, destaco seis pontos que considero de extrema relevância para os avanços aguardados: a transparência dos relatórios a serem apresentados pelas partes; a edição de normas complementares do Rulebook do Acordo de Paris, em especial o art.6º, sobre cooperação em ações de mitigação; o cumprimento do Programa de Nairóbi sobre Adaptação aos impactos da mudança do clima; a operacionalização da Rede de Santiago sobre perdas e danos; a definição das metas de financiamento; e a periodicidade de revisão das contribuições nacionalmente determinadas (NDCs). Como existe um ‘gap’ considerável entre o conteúdo das NDCs já apresentados e aquilo que seria necessário para a redução de emissões, espero que a reunião em Glasgow propicie a criação de um ambiente de governança adequado à colaboração interestatal equitativa. No plano nacional, cada estado-parte deverá revisar a sua legislação para assegurar a implementação efetiva e acelerada de seu respectivo NDC – outro tema vital e controverso a ser tratado em Glasgow.”


Leila da Costa Ferreira, professora de Sociologia Ambiental da Unicamp

Leila da Costa Ferreira, professora de Sociologia Ambiental da Unicamp (Unicamp/Divulgação)

“É inegável que nas últimas décadas o Brasil tem tido relevância e protagonismo na área ambiental, incluindo aqui a emergência climática. Em todos os setores da sociedade houve avanços na internalização da problemática e podemos dizer que a relação política e ciência contribuiu muito para esse processo. Destaco a relevância dos cientistas brasileiros em postos internacionais e nacionais de formulação e implementação de políticas climáticas. Destaco ainda a importância da diplomacia brasileira no âmbito internacional e saliento o papel que tivemos na Conferência Rio+20 na proposição dos ODS – Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. A partir de 2019, entretanto, no atual governo, há grande ceticismo em relação ao aquecimento global e à emergência climática. Além disso, são promovidas ações contra o ambiente em casa, em consonância com os grupos ruralistas, aumentando drasticamente o desmatamento e as queimadas. Neste sentido, as expectativas para a COP26 não são animadoras e devemos pensar nas eleições de 2022, em que estaremos celebrando 50 anos de Estocolmo.” 


Ane Alencar, Diretora de Ciência do IPAM

Ane Alencar, Diretora de Ciência do IPAM (IPAM/Divulgação)

“A expectativa é que a COP26 reforce o debate sobre a urgência climática, a necessidade de mais ambição dos países e repactuação das metas para evitar o pior. O Brasil deveria estar se preparando para se posicionar de forma clara e propositiva em relação à sua governança ambiental, redução expressiva do desmatamento e incentivos a boas práticas na agropecuária. Mais de 70% das emissões brasileiras de gases do efeito estufa vêm da soma desses dois setores, e a recolocação do Brasil no debate do clima passa pela recuperação da confiança no controle da ilegalidade ambiental, em especial a Amazônia.”


Francine Lemos, Diretora Executiva do Sistema B Brasil

Francine Lemos, Diretora Executiva do Sistema B Brasil (Cause/Divulgação)

“Espero que a COP26 estimule empresas a caminharem para uma economia carbono zero, com lideranças de diversos setores trazendo metas de redução de emissões mais ousadas e efetivas. Mais do que isso, espero que o evento traga também ações práticas para que essas metas possam sair do papel. Na minha visão, isso só será possível por meio de acordos de parcerias, criação de ambientes de trocas de experiências e construção de soluções coletivas. A COP26 é uma grande vitrine e uma excelente oportunidade de reunir as melhores mentes do mundo inteiro sobre o tema”.


Tasso Azevedo, coordenador técnico do Observatório do Clima e do Mapbiomas

Tasso Azevedo, coordenador técnico do Observatório do Clima e do Mapbiomas (Claudio Angelo/Divulgação)

“Espero que nesta COP26 sejam ampliados de forma decisiva os compromissos com a descarbonização da economia antes da metade do século, incluindo o fim do desmatamento e dos investimentos em combustíveis fósseis até 2030. Também espero ver a regulamentação do mercado de carbono no escopo do Acordo de Paris.”



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