Do Chile à Argentina: o pesado custo dos ajustes na América do Sul

Levante social no país mais estável do continente e provável derrota de Macri na Argentina são marcos do momento de tensão generalizada no continente

A seis dias do primeiro turno nas eleições presidenciais na Argentina e no Uruguai e a oito semanas de um provável segundo turno das eleições na Bolívia, a América do Sul começa uma semana de especial tensão política e social.

Na Bolívia, o atual presidente Evo Morales provavelmente terá que ir a um inesperado segundo turno na busca por seu quarto mandato. Apesar das declarações de Carlos Mesa, ex-presidente e principal opositor, de que não confia no tribunal eleitoral, o país deve ter uma segunda-feira relativamente pacífica — ao menos em comparação a seus vizinhos do norte e do sul.

No tradicionalmente estável Chile, o fim de semana foi de levante popular contra o governo após o anúncio de aumento nas tarifas de metrô em Santiago. Foi o estopim para uma onda de protestos contra o que a oposição chama de queda na qualidade de vida provocada pelas políticas liberais do governo de Sebastián Piñera.

As manifestações e os confrontos continuaram mesmo depois de o governo revogar o aumento, com o exército nas ruas pela primeira vez desde o fim da ditadura. Sete pessoas já morreram e restaurantes e supermercados estão fechados. O estado de emergência deve durar mais duas semanas. Ajudou a piorar a crise o fato de Piñera ter sido visto jantando numa pizzaria de um bairro nobre de Santiago na noite de sexta-feira, reforçando o discurso da oposição de que ele está distante do chileno comum.

O mesmo discurso levou a manifestações no Equador, no início do mês, após o fim de subsídios aos combustíveis como parte de um pacote de ajuste fiscal acertado com o Fundo Monetário Internacional. Reformas que não ajudaram a impulsionar a economia e que apertaram a renda da classe média também estão entre as causas que devem levar o presidente argentino, Mauricio Macri, a uma derrota no primeiro turno, no domingo.

O ano de 2019 da América do Sul ainda teve troca de presidente no Peru, onde Congresso e Executivo ainda discutem quem manda no país. “No Equador e no Chile há algo claramente em comum, que são as políticas de ajuste e seus impactos. No Peru parece-me algo distinto, mais relacionado à dinâmica do sistema político e da ilegitimidade de setores da classe política”, diz o cientista político Claudio Couto, da Fundação Getúlio Vargas. Houve ainda um pedido de impeachment no Paraguai, a Venezuela dispensa comentários, e o Brasil vive mais um ano de instabilidade nas relações entre executivo e o Congresso. A América do Sul vive só mais um ano de instabilidade, ou há algo de novo no ar?

“O Chile vive um período de crescimento baixo desde a reversão das commodities, executou reformas que não melhoraram a vida da população e está com desigualdade em alta e polarização política”, diz a economista Monica de Bolle, diretora de estudos latino-americanos da universidade americana Johns Hopkins. É uma combinação que, segundo ela, pode trazer problemas ao Brasil, com informalidade crescente, alta desigualdade e baixo crescimento econômico.

Sergio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados, destaca que nos outros países, salvo o Chile, a crise costuma ter como pano de fundo o passado autoritário, a baixa educação e a insegurança jurídica. “O subdesenvolvimento não se improvisa. É uma longa construção com saídas difíceis”, diz.

“O problema costuma ser parecido pelo continente. Um governo aperta o cinto e é seguido por um que esculhamba, elevando-se o custo no ciclo seguinte”, completa Celso Toledo, economista da consultoria LCA.

Com tantos problemas, o FMI cortou na semana passada a projeção de crescimento da América Latina de 0,6% para 0,2% em 2019. Além de nossos vizinhos, o México também não vive um bom momento. Faltam dez semanas para terminar o longo ano de 2019.

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