“Dói demais”, dizem familiares 1 ano após desastre em Brumadinho

Brumadinho – O centro de Brumadinho, em Minas Gerais, foi tomado na manhã deste sábado por uma romaria em homenagem aos mortos no desabamento da barragem da Vale, que completa um ano hoje.

Na homenagem, centenas de balões vermelhos com a frase “Dói demais o jeito que vocês foram embora” foram distribuídos entre familiares e amigos das vítimas.

“Perdi meu irmão. Ele trabalhava em uma terceirizada, deixou esposa e três filhas, todas fazer tratamento hoje. Não tem um dia que eu não pense nele”, diz Ronaldo Bernardino Sena.

A comerciante Lenice Ferreira Magalhães Mendes perdeu um sobrinho e sete primos. “Todo lugar que vamos, pensamos neles, nos planos que cada um tinha. Fico imaginando como foi, fico assustada com qualquer barulho”, conta. Ronnie Kennedy trabalhava na mina há 30 anos. “Eu estava de férias no dia. Perdi quase 300 amigos. As vezes acordo de madrugada assustado. É muito difícil”.

A homenagem teve apresentações de grupos de bateria e zabumba, missa e discursos de familiares das vítimas da tragédia.

Além dos moradores de Brumadinho, estavam presentes grupos de outras regiões afetadas, dentre eles quilombolas e indígenas. Ivone dos Santos  Silva veio da comunidade quilombola de Morrinhos para participar do cortejo. “Meu filho e meu neto estavam em casa quando a lama chegou. Graças a Deus conseguiram escapar. Nós ficamos 3 meses ilhados lá”, afirma. Um grupo de atingidos pelo desastre da Samarco em Mariana também acompanhou a romaria.

Às 12h28 do dia 25 de janeiro de 2019, a barragem 1 da mina do Córrego do Feijão, em Brumadinho, desabou soterrando tudo o que havia pela frente. O refeitório do complexo foi atingido bem na hora do almoço.

Máquinas, casas, carros, animais e plantações foram varridos pela enxurrada de rejeito de minério de ferro. 270 pessoas morreram e 11 delas continuam desaparecidas — as buscas do Corpo de Bombeiros continuam.

Passado um ano do desastre, o clima em Brumadinho é de espera e busca por justiça. “É como se fosse dia 25 todo dia. Todos os dias espero o meu marido voltar”, afirma Gisele Queiroz Gonçalves, 39. Meu filho de 7 anos ficou agitado, não quer que eu saia de perto dele. Pouco tempo depois da tragédia ele viu a foto do meu marido na televisão e achou que ele estivesse vivo. Foi muito difícil”.

No Parque da Cachoeira, um dos bairros mais atingidos, a lama continua exposta e invade as casas que antes ficavam na beira do rio. Boa parte delas não tem mais portas ou janelas. Quem continua vivendo ali reclama de falta de acesso à água. A Vale distribui água potável, mas não é suficiente.

Muitos moradores agora têm crises ansiedade e dificuldade para dormir. O consumo de ansiolíticos cresceu 79% e o de antidepressivos aumentou 56%. Foram 47 tentativas de suicídio em 2019 e três suicídios consumados. O número de atendimentos de saúde na cidade aumentou 40% e o município precisou criar três Unidades Básicas de Saúde. A equipe de saúde mental foi de 15 para 39 pessoas.

No comércio, a apreensão é sobre o que será da cidade quando movimento em torno da barragem rompida acabar. O exemplo de Mariana assusta. Foi lá que a barragem da Samarco se rompeu em 2015. Sem a atividade da mineradora, o município chegou a ter taxa de desemprego de 30%.

Denúncia

No início da semana, o Ministério Público de Minas Gerais apresentou denúncia contra a mineradora Vale, a consultoria alemã TÜV SÜD e 16 funcionários e executivos das duas empresas por conta do desabamento da barragem.

Funcionários e executivos foram denunciados sob acusação de homicídio doloso duplamente qualificado e por diversos crimes ambientais. Dentre eles está o ex-presidente da companhia, Fabio Schvartsman.

De acordo com a denúncia, a Vale ocultava informações sobre a segurança de suas barragens de forma sistemática e pressionava empresas de auditoria externa a emitirem licenças para suas estruturas.

Em nota, a TÜV SÜD informou que as causas do desastre “ainda não foram esclarecidas de forma conclusiva” e que a empresa “reitera seu compromisso em ver os fatos sobre o rompimento da barragem esclarecidos”. A consultoria acrescenta que continua “oferecendo cooperação às autoridades e instituições no Brasil e na Alemanha no contexto das investigações em andamento”.

Veja a nota da Vale na íntegra:

“A Vale informa que tomou conhecimento nesta data, 21 de janeiro de 2020, do oferecimento de denúncia pelo Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) com relação ao rompimento da Barragem I, na Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG).

Sem prejuízo de se manifestar formalmente após analisar o inteiro teor da denúncia, a Vale desde logo expressa sua perplexidade ante as acusações de dolo. Importante lembrar que outros órgãos também investigam o caso, sendo prematuro apontar assunção de risco consciente para provocar uma deliberada ruptura da barragem.

A Vale confia no completo esclarecimento das causas da ruptura e reafirma seu compromisso de continuar contribuindo com as autoridades.”

Confira a nota da defesa de Fabio Schvartsman, na íntegra:

“Fabio Schvartsman assumiu a presidência da Vale em maio de 2017, e desde então tomou diversas medidas para reforçar a segurança em barragens e ampliar consideravelmente os recursos destinados à área. Participou de inúmeras reuniões com a diretoria e o Conselho de Administração sobre barragens e sempre recebeu relatos técnicos e informações, lastreados por empresas de renome internacional, sobre a segurança das estruturas.

Quando do rompimento da barragem, ciente da gravidade dos fatos, tomou medidas imediatas para assistir às vítimas e suas famílias, além de determinar abertura de rigorosa investigação para esclarecer o ocorrido.

Denunciar Fabio por homicídio doloso é açodado e injusto. Açodado porque as investigações não estão finalizadas. A Polícia Federal já declarou que os laudos definitivos sobre as causas do acidente ficarão prontos em junho. Injusto porque desconsidera todos documentos apresentados às autoridades, que revelam a ausência de comunicação de quaisquer problemas em Brumadinho à presidência da Vale.

Se houve negligência de alguém, os responsáveis devem responder por seus atos. Mas é injusta e lamentável a tentativa de punir quem, desde a primeira hora, cumpriu com seu dever e esteve ao lado das autoridades para investigar o ocorrido e reparar os danos.”

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