Gilmar: “OCDE deve nos ensinar a combater corrupção sem corromper agentes”

Durante voto sobre prisão em 2ª instância, o magistrado teceu críticas à Lava Jato e à ONG Transparência Internacional

São Paulo — O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), votou nesta quinta-feira (07) contra a possibilidade de prisão de réus para cumprimento da pena após a condenação em segunda instância.

Na leitura do parecer, o magistrado, que já havia votado duas vezes a favor da prisão em segunda instância em julgamentos anteriores, dedicou parte de sua fala a explicar por que razões “evoluiu”.

“De forma cristalina, afirmo que o fator fundamental a definir essa minha mudança de orientação foi o próprio desvirtuamento que as instâncias ordinárias passaram a perpetrar em relação à decisão do STF em 2016. O que o STF decidiu em 2016 era que dar-se-ia condição para executar a decisão a partir do julgado em segundo grau. Ou seja, decidiu-se que a execução da pena após condenação em segunda instância seria possível, mas não imperativa”, disse.

O ministro acrescentou que “talvez o maior erro” tenha sido o estabelecimento, pelo Tribunal Regional Federal da Quarta Região no Rio Grande do Sul, de uma súmula — uma espécie de regra que deve ser aplicada em diversos casos — prevendo que a pena do réu deve ter início logo após a segunda instância, independentemente de recurso especial e extraordinário.

“Tal entendimento do TRF-4 foi firmado em dezembro de 2016 e sagrou-se como um mantra”, disse. Após o TRF-4 negar o recurso do ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva contra a condenação que lhe foi imposta por corrupção e lavagem de dinheiro, no caso do triplex do Guarujá, o petista foi preso.

As habituais críticas do ministro à Força-Tarefa da Operação Lava Jato também fizeram parte do voto. “Nós tínhamos um encontro marcado com as prisões alongadas de Curitiba. E as prisões provisórias de Curitiba se transformaram em sentenças definitivas. E depois se transformaram em decisões definitivas de segundo grau. Portanto, a regra era a prisão provisória de caráter permanente. E isso passou a me chamar a atenção”, afirmou.

Em seguida, o magistrado teceu críticas à antiga proposta da equipe de Curitiba de criar a Fundação Lava Jato, um acordo firmado entre a força-tarefa da operação e a Petrobras que destinaria 2,5 bilhões de reais para a instituição. A medida foi suspensa em março pelo ministro Alexandre de Moraes.

Em sua fala, Gilmar também questionou a participação da ONG Transparência Internacional em auxiliar a operação: “O combate à corrupção no Brasil dá lucro”, sustentou. “Nos últimos anos, a Transparência Internacional atuou como verdadeira cúmplice da força tarefa da Lava Jato nos abusos perpetrados ao modelo da justiça criminal brasileira”.

O presidente da Corte, o ministro Dias Toffoli, interrompeu o voto de Gilmar para lembrar que parte dos 2,5 bilhões de reais seria destinada a honorários de um “dado advogado”. Segundo Alexandre de Moraes, metade iria para a fundação e outra metade para os acionistas minoritários da Petrobras, representados por Modesto Carvalhosa.

“O advogado é o Carvalhosa, falso professor da Universidade de São Paulo, que foi reprovado em concurso. Veja que negociata toda. É preciso dizer à OCDE que eles nos ensinem a fazer combate à corrupção sem corromper os agentes da lei”, afirmou Gilmar.

“Fascista”

Ao iniciar a votação, o ministro se dedicou a fazer um resgate do histórico no país quanto ao momento em que a pena deve ser iniciada. Foi quando chamou de “fascista” a inspiração do Código Penal do ano de 1940, que permitia o início da pena logo após o julgamento em primeira instância.

Na época, o Brasil era governado por Getúlio Vargas. “E eu não estou aqui fazendo nenhum juízo de valor, estou simplesmente a dizer que se tratava de um código de inspiração claramente autoritária”, disse.

Em 1988, no entanto, a Constituição Federal estabeleceu que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

“Claro que o núcleo essencial desse princípio (da Constituição Federal) impõe o ônus da prova do crime e sua autoria à acusação. Sobre esse aspecto não há maiores dúvidas de que estamos falando de um direito fundamental processual de âmbito negativo”, disse Gilmar Mendes.

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