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Governo Bolsonaro usa fé cristã como eixo de política externa

Diplomatas e lideranças evangélicas falam em corrigir “erro histórico”, mas especialista critica viés religioso

BRASÍLIA – O discurso em nome da fé cristã se tornou um dos nortes da política externa brasileira no governo do presidente Jair Bolsonaro. Para aqueles que argumentam que, pela Constituição, o Estado é laico, os diplomatas mais próximos ao Palácio do Planalto têm uma resposta pronta: todos os credos e religiões devem ter o mesmo tratamento, mas a realidade é que o Brasil é um país cristão.

Essa nova vertente da diplomacia brasileira se consolidou há cerca de dez dias, em Washington, quando Brasil, Estados Unidos, Hungria e Polônia lançaram oficialmente a Aliança pela Liberdade Religiosa. O objetivo central desse “chamamento global” é combater a perseguição de cristãos no mundo.

Mas há outros movimentos na política externa. Brasil e Hungria discutem a criação de um fundo para financiar comunidades cristãs que vivem no Oriente Médio. Outro passo foi dado em março de 2019, quando o Brasil e mais sete países conseguiram aprovar uma resolução, na ONU, declarando 22 de agosto como o Dia Internacional em Memória das Vítimas de Atos de Violência baseados em Religião ou Crença.

Embaixada em Israel

No horizonte, existe a promessa de Bolsonaro de transferir a embaixada brasileira de Tel Aviv para Jerusalém. A medida, que segundo o presidente será tomada até 2021, tem a questão religiosa como pano de fundo — denominações evangélicas apoiam Israel no desejo de transformar Jerusalém em sua única capital.

O setor oriental de Jerusalém é considerado território ocupado pela ONU e reivindicado pelos palestinos como capital de seu futuro Estado. Se a transferência se concretizar, as relações do Brasil com os países islâmicos podem ser prejudicadas.

A guinada na política externa se repetiu em relação aos direitos humanos. O caso mais simbólico e polêmico nesse sentido ocorreu em março passado. A delegação brasileira nas Nações Unidas se recusou a assinar um documento sobre saúde reprodutiva da mulher, alegando que, por trás desse debate, estava embutido o direito ao aborto.

Uma fonte do governo Bolsonaro afirmou que, hoje, corrige-se um “erro histórico”: o Itamaraty defenderia os direitos humanos em todos os organismos multilaterais que participava, menos quando os direitos violados eram de cristãos. O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, costuma dizer que a política externa, hoje, “tem alma”.

Em uma deferência à bancada evangélica no Congresso, Bolsonaro e Ernesto Araújo costumam levar esses parlamentares em viagens internacionais. No início de janeiro, acompanharam Araújo para um périplo por países africanos os deputados Helio Lopes (PSL-RJ), Marco Feliciano (Podemos-SP) e Márcio Marinho (PRB-BA) — os dois últimos bispos da Universal. Todos são da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional da Câmara.

Feliciano ressalta que a “a igreja evangélica é missionária” e que “o internacionalismo está em seu DNA”. Ele diz, porém, que não há ingerência na política interna de outros países. Na África e na América Latina, há forte presença de igrejas brasileiras.

“Como parlamentares, juramos defender a Constituição, a qual salienta o direito à autodeterminação dos povos”, afirma.

Para Nelson Franco Jobim, professor de pós-graduação em Relações Internacionais das Faculdades Hélio Alonso, se o Estado é laico, a política externa não deve ter viés religioso. Para ele, a contaminação da política pela religião traz o risco do fundamentalismo.

“Vamos discriminar países muçulmanos? A religião é dogmática, não pode fazer concessões em diversas áreas. É uma boa desculpa para adotar políticas radicais em nome de Deus”, afirma.

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