STF decide que não pagar ICMS é crime

Quem deixa de pagar de forma contumaz e intencional o ICMS, o principal imposto recolhido pelos estados, está cometendo um crime, decidiu nesta quinta-feira o Supremo Tribunal Federal (STF) por sete votos a três. Na prática, quem deixa de recolher o imposto hoje ficava sujeito apenas a cobrança judicial em um processo cível. Agora, o devedor poderá ser processado criminalmente e ficará sujeito a pena de prisão.

“Não é quem deixou de pagar o ICMS eventualmente num momento de dificuldade, ou pulou um mês, dois meses, até três meses. É o devedor contumaz, o que não paga quase como uma estratégia empresarial, que lhe dá uma vantagem competitiva que permite que ele venda mais barato do que os outros, induzindo os outros à mesma estratégia criminosa”, explicou o relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso.

“O que estamos aqui é tentando enfrentar é o comportamento empresarial ilegítimo que gera a concorrência desleal. Em muitos mercados, ela é muito evidente. E é preciso que haja dolo, a intenção de se apropriar daquilo que não é seu. Ninguém está pretendendo punir o comerciante que esteja numa situação financeira adversa e não conseguiu pagar um mês, dois meses de tributo”, acrescentou.

Nesta quarta-feira, houve a terceira sessão do plenário do STF dedicada ao tema. Nove ministros, inclusive Barroso, já tinham votado. Agora foi a vez do presidente da Corte, Dias Toffoli, que acompanhou o relator e outros cinco ministros que votaram pela criminalização da prática: Alexandre de Moraes, Luiz Fux, Edson Fachin, Rosa Weber e Cármen Lúcia.

Outros três integrantes do STF discordaram e entenderam que não é crime: Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio Mello. O ministro Celso de Mello, que também se manifestaria nesta quinta-feira, não estava presente e o julgamento foi concluído sem o voto dele.

A conduta está prevista na lei 8.137, de 1990, que define os crimes contra a ordem tributária. O ilícito é “deixar de recolher, no prazo legal, valor de tributo ou de contribuição social, descontado ou cobrado, na qualidade de sujeito passivo de obrigação e que deveria recolher aos cofres públicos”.

A apropriação indébita tem pena de seis meses a um ano de prisão, mais pagamento de multa. Segundo dados encaminhados ao Supremo, em 2018 a dívida declarada e não paga de ICMS em 22 estados era de mais de R$ 12 bilhões.

O processo em julgamento é um recurso de lojistas de Santa Catarina denunciado pelo Ministério Público estadual por crime contra a ordem tributária por não ter repassado aos cofres públicos, no prazo determinado, o valor referente ao ICMS em diversos períodos entre 2008 e 2010.

Segundo a defesa, a simples inadimplência fiscal não caracteriza crime, pois não houve fraude, omissão ou falsidade de informações ao fisco.

Na prática, quando é feita a comunicação ao Fisco de que existe a dívida, o comerciante passa a ser considerado inadimplente. O entendimento é diferente nos tribunais: alguns consideram que o devedor também pode ser processado criminalmente; outros, que a única possibilidade é o poder público cobrar a dívida. A decisão do STF pacificará essa interpretação.

Embora o julgamento seja apenas de um caso específico, a interpretação da mais alta corte do país abrirá o caminho para que outros tribunais adotem a mesma tese.

Em uma sessão anterior, Barroso explicou que, na prática, o consumidor arca com o custo do imposto, já que o comerciante embute o ICMS no preço final. Portanto, se a empresa não repassa o valor ao Fisco, comete crime.

“Se o sujeito furtar uma caixa de sabão em pó no mercado, o Direito Penal é severo. Penso que quando há crime tributário, deve ser igualmente sério. Tratar diferentemente furto da sonegação dolosa faz parte da seletividade do brasileiro, que considera que crime de pobre é mais grave do que crime de rico”, afirmou Barroso.

Também em outra sessão, Moraes argumentou que a sonegação fiscal no país é tratada de forma condescendente com o devedor.

“Existem duas formas de se combater a sonegação fiscal: a brasileira e a correta. No Brasil, nem se pedir pra ser preso um sonegador vai conseguir”, disse Moraes. “É mais arriscado jogar na roleta em Las Vegas do que sonegar imposto no Brasil”, completou o ministro.

“Está introjetada na cultura do povo essa possibilidade de sonegar, como se isso não fosse tão grave quanto a corrupção”. Os três ministros que ficaram no time minoritário ressaltaram que esse tipo de dívida só pode ser criminalizado se ficar comprovada fraude.

“A norma penal repele responder com tipo penal pagamento de divida. Só é permitido em caso de fraude”, disse Gilmar Mendes em uma sessão anterior. “A intervenção criminal só se justifica na medida que houver fraude pelo agente. Na falta de tal elemento, resta cristalino o vilipêndio da criminalização do mero inadimplemento”.

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