“Cumprir teto de gasto não basta para fazer o ajuste fiscal”, diz Mansueto

O Brasil corre o risco de passar os próximos anos enfrentando seguidos déficits, com as contas do governo federal no vermelho. Isso porque cumprir o teto de gastos não será mais suficiente para o país fazer o ajuste fiscal. É o que alerta Mansueto Almeida, economista-chefe do banco BTG Pactual (do mesmo grupo da EXAME) e ex-secretário do Tesouro Nacional.

Segundo Almeida, como foi desenhada a regra, o Brasil chegaria em 2026 com um superávit primário de 2,5% do PIB, o equivalente a pouco mais de 200 bilhões de reais de hoje – o que não deve mais acontecer.

“No ano passado, o Brasil perdeu 80 bilhões de reais em arrecadação, isso significa menos 1,3% do PIB. E se não recuperar essa arrecadação, o país vai passar pelo menos mais cinco ou seis anos com déficit, mesmo cumprindo o teto de gastos”, diz o economista.

Ou seja, o governo irá precisar cortar mais de um lado e buscar mais recursos de outro, o que exige acelerar na agenda de reformas econômicas. Leia a seguir a entrevista completa:

A discussão sobre o Orçamento de 2021, que já foi aprovado, ainda se arrasta há semanas. O que precisa ser efetivamente resolvido?

O que aconteceu foi que o Orçamento aprovado foi muito acima do que tinha sido negociado com o Congresso, que havia fechado emendas parlamentares na casa de 16 bilhões de reais. Só que o projeto do relator, que veio com emendas de 30 bilhões de reais, foi aprovado. O que exigeria cortar outros itens do Orçamento, que não podem ser cortados.

Todos concordam – Executivo e o próprio Congresso – que o Orçamento tem que ser corrigido. O impasse agora é de que forma vai se fazer essa correção. O governo gostaria de vetar toda a emenda do relator, enviar imediatamente um novo projeto de lei ao Congresso, aumentando a despesa obrigatória, que está subestimada ,e recompondo parte das emendas parlamenatares. Já o Congresso quer que o presidente sancione o Orçamento sem nenhum veto e, então, mande uma nova proposta de lei. São dois caminhos que chegariam, em tese, no mesmo lugar.

Qualquer que seja a solução – com vetos ou sem vetos – o Orçamento vai ter que ser modificadado. Os dois lados têm que conversar e ver o que é possível para dar segurança jurídica para todo mundo. Acho que está bem perto de um acordo.

Apesar das emendas que vieram com um valor superior, o Orçamento havia encolhido muito. O que aconteceu?

Quando foi aprovado em 2017, o teto de gastos seria corrigido pela inflação acumulada em dozes meses até junho do ano anterior. Em 2020, o IPCA até junho foi bem baixo, 2,1%. Esse percentual permitiu um crescimento do teto para o ano de 2021 de apenas 31 bilhões de reais.

Já as despesas obrigatórias tradicionalmente crescem entre 60 e 70 bilhões por ano. Previdência, seguro desemprego, abono salarial, Benefício de Prestação Continuada, entre outros, são corrigidos por outro índice, o INPC, que no ano passado foi 5,45%. Logo, é impossível fazê-las caber nesse aumento de 30 bilhões de reais, obrigando um corte na parte discricionária, como investimentos. Resumindo: o índice que corrigiu as despesas obrigatórias foi muito maior do que o  que corrigiu o teto. Foi isso que tornou o Orçamento tão apertado.

Mas a perspectiva é de uma folga orçamentária em 2022…

Isso. Em 2022, veremos o efeito contrário. A inflação aumentou muito no segundo semestre do ano passado e no primeiro semestre deste ano. Então, quando o Orçamento de 2022 for construído, a inflação acumulada até julho deste ano deve estar em cerca de 7,5%. O que trará uma folga orçamentária que, pelos nossos cálculos, será de 111 bilhões de reais.

Isso significa que no próximo ano será possível aumentar a despesa discricionária, inclusive, investimento. No início do governo Bolsonaro, ninguém trabalhava com essa hipótese de a inflação dar um pulo até o meio do ano e depois cair. O Orçamento mais duro para ele cumprir seria justamente o de 2022. Agora, não.

De qualquer forma, o Brasil tem um déficit grande para lidar este ano …

Este ano vai ter um buraco fiscal muito grande, cujo déficit programado é de 247 bilhões, o equivalente a 3% do PIB. É verdade também que ele é muito menor do que o do ano passado. A despesa em 2020 foi de quase 2 trilhões de reais, o equivalente a 26% do PIB. O déficit no ano passado foi de mais de 700 bilhões de reais. Ou seja, passaremos de um déficit primário de 10% do PIB para 3% do PIB. Essa é a notícia boa.

Agora, a notícia ruim: no ano passado, o Brasil perdeu 80 bilhões de arrecadação, isso significa menos 1,3% do PIB. E se o país não recuperar essa arrecadação, o país vai passar pelo menos mais cinco ou seis anos com déficits, mesmo cumprindo o teto de gastos.

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