O segredo das empresas que souberam se transformar na pandemia

Em março, lá se vão dois anos desde que a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou a pandemia do novo coronavírus. Desde então, o mundo passou a enfrentar mudanças como lockdown, isolamento social, trabalho remoto… E diante desse novo cenário, as empresas — sejam elas grandes ou pequenas —, tiveram de se digitalizar, se transformar, e criar novos modelos de negócios para sobreviver a uma pandemia ainda sem data para acabar.

“Agora as empresas convivem com a reinvenção constante, seja utilizando tendências e tecnologias existentes ou emergentes como crowd shipping, social selling, democratização do metaverso e muitas outras. Tudo amplificado pelo comportamento dos consumidores brasileiros que são os que mais aderem aos bancos digitais, por exemplo, e passam a ter maior preocupação com fraude no e-commerce e proteção de seus dados”, ressalta Cristiane Amaral, líder do setor de consumo da EY para América do Sul.

Para acompanhar os impactos dessas mudanças, a EY-Parthenon, braço de consultoria estratégica da EY, tem monitorado o comportamento do consumidor desde o começo da pandemia. O cenário, mostrado no estudo EY Future Consumer Index (FCI) 2021, mostra, entre outras coisas, que os brasileiros já estão mais do que acostumados com a compra online.

Para ter uma ideia, 73% dos consumidores de alta renda afirmaram que produto disponível e com possibilidade de entrega via delivery é um fator mais importante agora do que antes da pandemia, ante 55% daqueles de baixa renda.

“O delivery passou a ser parte da proposta de valor das marcas aos seus clientes, em que, quanto maior seu nível de atendimento, maior fidelidade do shopper ao produto ou serviço. Para ter uma ideia, o quick commerce (delivery de 15 minutos a 2 horas) chegam a incrementar 30% mais da frequência de compra versus uma entrega comum”, explica Natália Sperati, socia líder de customer e growth para o setor de consumo da EY.

A experiência do consumidor termina com a entrega do produto e o suporte pós-venda. A pesquisa da EY mostra que os três maiores fatores de frustração para uma compra online são frete caro (54%), lentidão na entrega (41%) e dificuldade de troca de produtos (31%). Uma má experiência nestes quesitos faz com que o cliente abandone a compra no carrinho virtual, ou pensará duas vezes para confirmar uma compra com aquela empresa novamente.

Jerri Biscuola, sócio de supply chain e operações da EY, explica que a entrega last mile, processo que garante que o produto chegue no local certo, no tempo correto e a um preço competitivo, juntamente com a logística reversa são fundamentais para garantir uma boa experiência do consumidor, que muitas vezes não tem a atenção devida das empresas ou são tratados de maneira isolada dentro das organizações.

“Para ter eficiência na distribuição last mile e na logística reversa, é necessário ter uma abordagem holística da cadeia de abastecimento”, comenta Jerri Biscuola.

O período foi especial para o fortalecimento dos modelos de negócios ecossistêmicos, onde as empresas se unem para cocriar um produto ou um serviço, comercializar para um conjunto comum de clientes e compartilhar o valor que eles geram. Um estudo com mais de 800 líderes de negócios que utilizam pelo menos um modelo de negócios de ecossistema revelou que eles representam, em média, 13,7% de suas receitas anuais totais, geram 12,9% em redução de custos e 13,3% em ganhos incrementais.

Mas nem todos os ecossistemas são criados iguais. Ecossistemas de alto desempenho geram 2,1 vezes o crescimento incremental da receita, em comparação com ecossistemas de baixo desempenho. No ano fiscal de 2020, as empresas com ecossistemas de alto desempenho também tiveram maior crescimento médio de receita e margem de lucro líquido geral.

De acordo com outro estudo da EY, o CEO Imperative, realizado também em 2021, mais de 85% dos executivos concordam que os ecossistemas são uma maneira eficaz de conectar grandes empresas a pequenos disruptivos e promover a inovação em cadeias de valor e indústrias adjacentes.

Não à toa, os marketplaces ganharam muito espaço na pandemia. “O modelo foi essencial para que pequenos e médios negócios conseguissem acessar seus clientes durante o lockdown”, destaca Cristiane Amaral, sócia da EY. Nos primeiros três meses de 2021, mais de 30 mil novos restaurantes, mercearias e lojas de conveniência se registraram em algum app. Em março de 2021, 270 mil restaurantes operavam com a plataforma iFood.

Mas o país viu surgir também marketplaces de outros segmentos, como o farmacêutico, levando para o digital grandes empresas que ainda não tinham seu foco nas vendas online. Foi o caso da RD, que investiu recentemente no Vitat, um aplicativo que une farmácia, marketplace e serviços de saúde.

A tecnologia também possibilitou que marcas levassem seus showrooms para dentro da casa dos potenciais consumidores, de maneira 100% virtual, como foi o caso das montadoras Mercedes-Benz, Audi e Chevrolet. “Empresas tradicionais que ainda estejam enfrentando dificuldades em atuar nos canais digitais precisam buscar parcerias, porque a digitalização é – e seguirá sendo – fundamental”, alerta Cristiane.

Novas exigências do consumidor

No levantamento da EY-Parthenon, chama a atenção a preocupação dos brasileiros com suas finanças pessoais, o que tem feito com que os consumidores repensem seus gastos com produtos e serviços.

Ao todo, 60% dos entrevistados estão priorizando empresas que ofereçam serviço de qualidade e produtos ou serviços que proporcionem saúde e bem-estar.

Para Cristiane, as preferências dos clientes em todo o mundo estão evoluindo, cada vez mais, para produtos e serviços que sejam locais, autênticos, transparentes, rastreáveis e éticos, forçando as marcas a repensar e a otimizar continuamente sua estratégia de oferta e portfólio.

“O principal desafio das empresas no primeiro momento foi agir rapidamente e solucionar problemas urgentes. Agora, devem reimaginar seus negócios, de modo que a experiência do consumidor seja o centro de cada atividade ou processo, redesenhando o negócio em torno de como as pessoas vivem e não mais apenas o que compram”, afirma.

Algumas marcas, por exemplo, entenderam a busca dos consumidores por alimentos mais saudáveis e buscaram compartilhar seu portfólio. A PepsiCo criou uma joint venture com a Beyond Meat para desenvolver salgadinhos à base de plantas. Já a JBS adquiriu a Vivera, empresa europeia de produtos plant-based.

E diante do colapso no setor de turismo, a Airbnb também agiu rapidamente, se transformando em uma plataforma de estilo de vida e ainda ajudando os anfitriões que, agora, podem oferecer eventos online focados em arte, cultura e outras atividades com os usuários por uma taxa modesta.

Agilidade e apetite pelo risco

Sergio Menezes, sócio da EY-Parthenon para o Brasil, conta que esse tipo de mudança só é possível porque as alterações de comportamentos e expectativas dos consumidores forçou as empresas e seus líderes a mudar, a arriscar.

Quase 70% dos executivos planejam um grande investimento em dados e tecnologia; 61% pretendem empreender uma nova e importante iniciativa de transformação; e 65% esperam gastar mais em transformação nos próximos três anos em relação aos últimos três.

“Os dados também devem estar no centro da estratégia das empresas. Eles podem ser usados para aprender sobre o passado e prever o comportamento futuro, além de informar a maneira certa de se envolver com um consumidor a qualquer momento, indicando os fatores que influenciam os comportamentos, interesses e expectativas”, ressalta Menezes.

Os brasileiros entrevistados pelo FCI, porém, ainda não confiam plenamente nas empresas quando o assunto é segurança de dados. Nenhuma das organizações ou instituições abordadas pela pesquisa recebeu mais do que 20% de votos na total confiança de seus consumidores.

Ainda assim, 75% dos entrevistados afirmaram que compartilhariam seus dados para receber promoções personalizadas e 69% aceitariam compartilhar seus dados para viver uma experiência de compra mais eficiente.

Fica claro, portanto, que as empresas precisam enxergar o consumidor e suas exigências de forma holística, criando uma jornada de compra que além de rápida, eficiente e sem fricção, seja também de confiança.

“Existe uma série de transformações que se fazem necessárias com esses novos hábitos detectados. A principal delas é investir nos dados e tecnologias que possam torná-los uma parte confiável da vida do consumidor e uma empresa inteligente que faz escolhas assertivas”, diz Menezes.

Outra questão fundamental, diz Menezes, é que as pessoas estão migrando para um modo de consumo que privilegia a qualidade à quantidade. “Logo, as empresas vão precisar ter modelos de negócios nos quais se fazem necessários novos serviços e experiências para gerar novas fontes de receita”, conclui o executivo.

 



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