Risco eleitoral está sobreprecificado e dólar pode desabar, diz AZ Quest

A polarização entre o presidente Jair Bolsonaro e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na disputa eleitoral é vista como um dos principais fatores de alto risco por boa parte dos investidores. Mas, para Walter Maciel Neto, CEO da AZ Quest, e Welliam Wang, head de da gestora, as incertezas eleitorais são mínimas.

“Já estamos há mais de três anos com o Bolsonaro e ficamos oito anos com o Lula. Podemos até não gostar de um ou do outro — ou mesmo dos dois –, mas a visibilidade não é baixa”, disse Walter Maciel, um dos mais experientes profissionais do mercado, em entrevista à EXAME Invest. “A maior incógnita, talvez, é a terceira via.”

Welliam Wang afirmou que as da estão descontadas em relação ao que deveriam valer e que as eleições podem abrir espaço para altas. “Podemos ver um cenário de eleição muito melhor que o esperado. Do lado das empresas, tem muita ação barata, especialmente as de commodities e bancos. No geral, estamos otimistas.”

O Brasil é muito melhor do que está precificado”, disse Maciel. O ponto-chave para a melhora de humor, segundo ele, serão os nomes indicados ao Ministério da Economia do futuro governo pelos presidenciáveis

No momento em que mercado perceber que o novo governo — que pode ser o segundo mandato de Bolsonaro — será ortodoxo do ponto de vista fiscal, há potencial gigante de valorização dos ativos brasileiros. Um desses é o mais importante, que é o câmbio. O real está precificado para o desastre. Não deveria estar nesse “, disse o CEO da AZ Quest, uma das maiores e mais tradicionais gestoras do mercado, fundada em 2001 e com cerca de 18 bilhões de reais em ativos sob gestão.

Confira a entrevista com Walter Maciel Neto, CEO da AZ Quest, e Welliam Wang, CFA, head de renda variável.

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Apesar de todas as incertezas do ano eleitoral, quais são as perspectivas da AZ Quest para 2022? 

Walter Maciel Neto: Não acho que a visibilidade seja tão baixa quanto falam. Já estamos há mais de três anos com o Bolsonaro e ficamos oito anos com o Lula. Podemos até não gostar de um ou do outro — ou mesmo dos dois –, mas a visibilidade não é baixa. O primeiro governo do Lula foi muito responsável, com 3,5% de superávit primário no primeiro ano. Já no segundo governo, com o mensalão, ele teve que se segurar em movimentos sociais e perdeu a postura ortodoxa. 

Nenhum dos dois é o candidato dos meus sonhos. No governo Bolsonaro, houve coisas difíceis de defender. Porém não dá para analisar de forma justa o seu governo sem considerar o maior choque econômico da história moderna. A pandemia e a de 1929 são eventos parecidos. 

Estamos longe de ter um candidato ideal. A discussão, em outras eleições, era tabelar câmbio, congelar poupança, Hoje, o diálogo é muito mais moderno. Na quarta-feira [dia 19], o Lula surpreendeu muito ao dizer que o BC não tem que servir o presidente, tem que servir o país. Ele não falou que quer o BC independente, mas é a mesma coisa. 

Estamos entre uma agenda mais Escola de Chicago [a principal referência da economia liberal] e uma mais ortodoxa, mas olhando mais para a desigualdade de renda e a necessidade de crescimento. De 2016 para cá, temos visto candidatos com reais chances de ganhar divergindo muito pouco do ponto de vista econômico.

O Brasil é muito melhor do que está precificado. Nosso maior problema hoje é o Banco Central ter deixado o juro baixo por mais tempo do que deveria. O fenômeno global da inflação está muito mais forte aqui. 

Considerando que o Brasil começou a subir o juro mais cedo, em março de 2021, devemos ver a inflação cair antes que no exterior?

Walter Maciel: Sim, mas por um motivo ruim, que é a recessão. Meu negócio é gerir a AZ Quest, não tomo decisão de investimento. Mas falava para o Welliem que, quando o mercado revisasse a inflação para baixo, poderia haver uma mudança de sentimento. De duas semanas para cá, algumas revisaram, mas por um mau motivo, que é o crescimento mais baixo da economia brasileira. 

Apesar desse cenário, devemos ver o em alta neste ano?

Welliam Wang: Acreditamos que sim. Podemos ver um cenário de eleição muito melhor que o esperado. O PT cria uma imagem muito negativa na visão do mercado, mas, no fim do dia, é o Lula quem manda – e o Lula é muito responsável.

Do lado das empresas, tem muita ação barata, especialmente as de commodities e bancos. No geral, estamos otimistas. Acreditamos que vai haver um desapontamento no setor de consumo e varejo. O juro alto afeta diretamente o consumo de bens duráveis. Para a população média é inviável comprar uma televisão à vista. 

AZQUEST - WELLIAM WANG - FOTO: GABRIEL REIS www.gabrielreisfoto.com

Welliam Wang: CIO e head de renda variável da AZ Quest | Foto: Gabriel Reis/Divulgação (Gabriel Reis/Divulgação)

O risco eleitoral mais brando pode impulsionar ações de estatais?

Walter Maciel: Apesar de Bolsonaro ter criado muita volatilidade com a história da Petrobras (PETR3/PETR4), ele não interferiu no preço. Houve continuidade no respeito às estatais, como no governo de Michel Temer.

Se o Lula anunciar um nome mais moderado para a Economia, como Armínio Fraga, Pérsio Arida ou Marcos Lisboa, há chance de as estatais andarem muito bem. Se o candidato favorito der sinal de que não será populista, deve haver uma correção de preços muito forte nas estatais. 

O nome do ministro da Economia será a peça central?

Walter Maciel: Como já temos o Banco Central independente, a figura do ministro é o ponto-chave. O ministro da Economia dará uma indicação clara do que acontecerá no mandato. É uma variável determinante – e o mercado não vai ficar tranquilo enquanto não souber.

Não temos preferência política, nossa preferência é ir bem nos fundos. O gestor com preferência política vai com um viés. Não tem incerteza, porque o mercado já conheceu os principais candidatos em ação. A maior incógnita, talvez, é a terceira via, que nunca vimos. 

No momento em que mercado perceber que o novo governo — que pode ser o segundo mandato de Bolsonaro — será ortodoxo do ponto de vista fiscal, há potencial gigante de valorização dos ativos brasileiros. Um desses é o mais importante, que é o câmbio. O real está precificado para o desastre. Não deveria estar nesse preço, mesmo com a melhora recente. O país tem boa parte de suas dívidas roladas no curto prazo e os juros subiram muito. 

Alguns fundos da AZ Quest conseguiram bater o Ibovespa em mais de 10 pontos percentuais em 2021. Qual foi a estratégia?

Welliam Wang: Estávamos com visão mais negativa para a macroeconomia devido à inflação, que é muito relevante para a média da população brasileira. O consumo básico aumentou muito em relação à renda média, sobrando pouco dinheiro para o consumo discricionário, e as empresas de consumo brasileiro embutiam muito crescimento nos preços. Então fizemos posição vendida em uma cesta de ações de consumo, principalmente no e-commerce.

Estamos vendo uma competição muito forte por parte de players internacionais, como a Amazon, com mais de dez centros de distribuição no Brasil. Eles são muito agressivos, não focam em rentabilidade, mas no . Eles podem fazer isso porque valem 1,7 trilhão de dólares. 

As empresas brasileiras vão ter compressão de margem para entregar desaceleração de receita. Ela vai estar subsidiando o próprio mercado, mas só para manter a base atual de clientes. 

Já começou a aparecer [nos resultados] desaceleração muito forte de receita e compressão de margem. Isso vai continuar. Vamos ter de 10% a 20% de queda de venda nas lojas físicas, o que levanta questionamentos sobre se o omnichannel é uma vantagem competitiva. Talvez esse tenha sido só um passo para o 100% online. 

A posição vendida teve peso maior em alguma empresa?

Welliam Wang: Foi em todo o setor, ponderado pelo valor de mercado e pela liquidez, mas também consideramos nossa avaliação. A Via (VIIA3), por exemplo, está em uma situação mais frágil. 

Há muito subsídio no mercado de e-commerce. O mais recente é o do Shopee [de Singapura]. Quando eles chegaram ao Brasil, cobravam 0% de take rate [comissão] do vendedor e frete grátis para qualquer valor de entrega. 

Dado o cenário e o nível de competição, a margem piorou. Houve muita entrada de dinheiro nesse mercado. Está todo mundo capitalizado. Quem não tem dinheiro, está fora do jogo. Se não tiver capacidade de subsidiar o cliente, vai perder mercado e se tornar irrelevante.

Quem não tem dinheiro hoje é a Via, que está endividada e o cenário macro joga contra. Outras empresas estão capitalizadas, mas vão perder margem.

A AZ Quest manteve a posição vendida para este ano? 

Welliam Wang: Sim, porque vai haver piora de resultado. Vamos ver o número de vendas nas lojas físicas cair e ter desaceleração ou mesmo queda nas vendas do e-commerce. Isso vai levar a questionamentos estruturais. “Será que o omnichannel é tudo isso?” Com certeza, os planos de expansão de lojas vão ser revistos. Eventualmente, vai haver fechamentos de lojas. 

Na parte comprada, quais são as principais apostas da gestora?

Welliam Wang: A principal aposta de alta é a Localiza (RENT3). Em 2021, eles sofreram com a queda de produção de automóveis leves, que rodava na metade dos níveis de 2019. Já vemos uma recuperação da produção, o que vai elevar a oferta. 

Devemos ver o preço médio do aluguel aumentar, com a Localiza conseguindo repassar custos, principalmente o da alta de juros. 

A fusão com a Unidas (LCAM3) foi muito positiva. A empresa vai passar a deter 70% do market share no mercado de pessoa física, 20% no de aluguel corporativo e 12% no de seminovos. Pelas nossas contas, a união deve gerar 5 bilhões de reais em sinergias, principalmente com corte de custos e melhor aquisição de carros. 

Alguma exposição a commodities?

Welliam Wang: Estamos otimistas com energia. Os níveis de estoque estão historicamente baixos nos Estados Unidos. Já a demanda tem sido forte, principalmente agora, no inverno no Hemisfério Norte.

O nível de investimento caiu devido à agenda ESG, mas a demanda, não, e a Ômicron se mostrou muito mais branda do ponto de vista de saúde e econômico. Esses fatores devem levar ao aumento do preço do petróleo. Temos Petrobras (PETR3/PETR4), PetroRecôncavo (RECV3) e 3R (RRRP3). 

Como fica a inflação global nesse cenário de commodities em alta? 

Walter Maciel: Estamos passando por um choque de desorganização de oferta, não de demanda. Os governos despejaram dinheiro nas economias e as vacinas funcionaram. Então as pessoas voltaram a ir ao shopping, a consumir, mas a oferta não teve tempo de se recuperar. No Brasil, ainda passamos muito tempo com o juro abaixo do adequado para uma economia que é menos eficiente do que a internacional. 

O Banco Central fez um grande ajuste na parte de juros. Mas isso vem a um custo de uma contração econômica fortíssima. O único alento que estamos vendo nos últimos dias é o recuo do dólar. Preços de energia, gás, combustível e até alimentos tendem a ceder com o dólar mais baixo.

Certamente, no começo do ano que vem, vamos ver o BC falar em reduzir juros para estimular a economia. O BC está tentando ancorar as expectativas, mas com uma bazuca. No momento em que a oferta se restabelecer, em um ano ou em um ano e meio e tiver essa correção [no dólar], acho que a inflação vai começar a ceder. 

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