No Itamaraty, sai o extremista e entra o cerimonialista

Se Jair Bolsonaro fosse um político normal, o pedido de demissão de Ernesto Araújo do Ministério das Relações Exteriores sinalizaria mudança na política externa. Considerado desastroso sob muitos aspectos, Araújo foi atacado especialmente após ficar claro que suas ações atrapalham a negociação de vacinas contra o coronavírus. Em pouco mais de dois anos no cargo, o ministro mostrou-se leal ao olavismo mais radical que se pode imaginar. A paranoia de que essa política se alimenta teve como pièce de résistance um tweet ligando a senadora Kátia Abreu (Progressistas) a interesses empresariais do Partido Comunista Chinês.

Há uma diferença do Itamaraty em relação a outros ministérios. Seja de direita ou esquerda, qualquer novo chanceler encontra, nos quadros da casa, diplomatas ansiosos para dar a guinada requerida pelo chefe. Quem destoa é punido de modo formal ou informal, como Milton Rondó Filho, o diplomata que em março de 2016, quando Dilma Rousseff (PT) passava por impeachment, comunicou a embaixadas que o Brasil estava sofrendo uma tentativa de golpe. Rondó Filho perdeu o direito de autorizar comunicações no ministério.

Quando Araújo assumiu o cargo, diplomatas com tendências ideológicas semelhantes foram puxados para cargos de confiança de alto nível. O Diretor do Departamento de Direitos Humanos e Cidadania sedia reuniões sobre temas como “liberdade de religião” com representantes do ministério de Damares Alves. A embaixadora do Brasil nas Nações Unidas, cotada para ministra, Maria Nazareth Farani Azevêdo, representou as ideias de Araújo no mais importante órgão de direitos humanos da ONU, fazendo o país minimizar a importância da educação sexual.

Mas quem levou o Itamaraty foi Carlos Alberto Franco França, diplomata mais conhecido por chefiar o trabalho de cerimonial do Palácio do Planalto. Como de hábito, Bolsonaro preza relações pessoais e discrição profissional para promover burocratas a cargos importantes. O novo ministro terá que se equilibrar entre o olavismo e a sisudez que o exercício da diplomacia exige.

(Este artigo expressa a opinião do autor, não representando necessariamente a opinião institucional da FGV.)

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