O impasse sobre o Orçamento de 2021 ganhou um novo capítulo nesta segunda-feira, 19, com o acordo fechado entre governo e parlamentares para aprovar um projeto de lei que busca resolver a situação. A apreciação do projeto pelo Congresso na noite desta segunda pode representar um passo em direção à sanção pelo presidente Jair Bolsonaro do texto que tem gerado incerteza no mercado e afetado projeções de índices econômicos. A Câmara dos Deputados já aprovou a medida, que deve ser apreciada ainda nesta noite pelo Senado.
A situação é olhada com atenção pelo mercado, que tem sido reativo, desde o início da briga em torno das contas públicas, à possibilidade de desrespeito ao teto de gastos e o aumento do risco fiscal do Brasil, avaliam analistas consultados pela EXAME.
A partir do acordo desta segunda-feira, o governo pretende alterar a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021 retirando um dispositivo que o obrigaria a cortar outras despesas ou encontrar novas fontes de receita para bancar programas temporários por meio de um projeto de lei do Congresso Nacional (PLN 2).
O relator do PLN, deputado Efraim Filho (DEM-PB), acatou uma emenda que retira da meta de resultado primário os créditos extraordinários voltados às despesas com ações e serviços públicos de saúde, desde que identificadas em categoria de enfrentamento à pandemia de covid-19. Ficam excluídos do teto também os gastos com o Pronampe e o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda. Além disso, o deputado apresentou parecer em que permite o bloqueio de R$ 9 bilhões em despesas discricionárias, exceto emendas parlamentares.
Com a medida, o presidente Jair Bolsonaro poderia sancionar o Orçamento com até R$ 18 bilhões em emendas do relator, cedendo a pressões dos parlamentares. O chefe do Executivo tem até esta quinta-feira, 22, para sancionar o texto.
A briga em torno das contas públicas que iniciou com a aprovação de um Orçamento com despesas obrigatórias subestimadas pelo Congresso no dia 25 de março já tem refletido nos índices econômicos. Com a incerteza sobre a situação fiscal do país, investidores têm sido cautelosos nas últimas semanas, o que ecoou nas altas cambiais, previsões da Selic e do Produto Interno Bruto (PIB), apontam os analistas.
O resultado das negociações será central para determinar como o risco relacionado à situação fiscal do Brasil refletirá nas taxas de crescimento econômico, avalia a economista-chefe do banco Ourinvest, Fernanda Consorte. “Esse é o ‘calcanhar de Aquiles’ do Brasil no momento”, afirma.
Até a semana passada, quando as negociações ainda não apontavam para um caminho claro de como o governo seguiria para sancionar o texto, o mercado já precificava parte do risco de um possível descontrole de contas.
A economista-chefe da Veedha Investimentos, Camila Abdelmalack, chama atenção para a alta das previsões da taxa de juros nas últimas semanas. “Num cenário de atividade econômica aquecida elevar os juros não significaria algo ruim, apenas a recuperação da atividade econômica. Mas não, estamos tendo que elevar a taxa por uma pendência em relação à política fiscal”, afirma.
Caso não seja encontrada uma solução dentro do teto, a tendência é que os efeitos se intensifiquem, avaliam analistas. O roteiro segue a ordem: a moeda desvaloriza, a perspectiva de inflação ultrapassa a meta do Banco Central, que por sua vez passa a subir os juros acima do esperado. Como consequência, a retomada da atividade econômica e o crescimento do PIB são afetados.
Saídas que retirem despesas do limite do teto para que o Orçamento não ultrapasse formalmente a legislação também podem ser interpretadas negativamente para o economista-chefe do Grupo Integral, Daniel Miraglia. “Não encontrando solução dentro do teto deve haver reação. Isso para que a dinâmica da dívida pública não se torne explosiva. Seja o teto rompido mesmo ou propostas que tirem despesas da conta do teto”, reforça.