Tribunal argentino condena 10 agentes da repressão da ditadura militar à prisão perpétua

A Justiça da Argentina condenou à prisão perpétua dez integrantes do aparato de repressão da ditadura militar argentina (1976-1983), todos acusados por crimes contra a humanidade cometidos em centros clandestinos de torturas e execuções em Buenos Aires.

A decisão do tribunal de La Plata veio dois dias depois do presidente Javier Milei reiterar um discurso negacionista sobre os anos da ditadura, incluindo o número de mortos e desaparecidos.

O processo concluído nesta terça-feira tramitava desde 2020, e analisava mais de 400 casos de sequestro, desaparecimento forçado de perseguidos políticos, homicídio, estupros, roubo de crianças, abortos forçados e outros crimes, ocorridos em três centros clandestinos na região metropolitana de Buenos Aires. Um deles, conhecido como a Brigada de Lanús, ficou conhecido como “o inferno”, por conta das graves violações cometidas pelos agentes da repressão. Ao todo, 610 casos foram analisados pelo tribunal.

Todos acusados operavam sob as ordens de Miguel Etchecolatz, ex-chefe da polícia da capital e um dos principais torturadores da ditadura, que foi diretamente responsabilizado por 21 desses centros — condenado a nove penas de prisão perpétua, ele morreu no cárcere, em 2022, aos 93 anos de idade.

Além de Etchecolatz, outros cinco acusados morreram ao longo do processo. Além dos 10 condenados à prisão perpétua, um outro réu recebeu pena de 25 anos de prisão e outro foi absolvido. Eles acompanharam a leitura da sentença de forma remota, e chegaram a ser repreendidos pelo magistrado por terem desligado suas câmeras em alguns momentos da sessão. No tribunal, sobreviventes e parentes das vítimas celebraram a decisão.

— Estou feliz, estamos atravessando um momento difícil em nosso país sobre a verdade e a memória, e esse é um grande impulso para seguirmos demonstrando que houve um genocídio, com 30 mil desaparecidos, e que ainda precisamos encontrar mais 300 irmãos — disse à AFP María Victoria Moyano Artigas, que nasceu em um dos centros de tortura onde sua mãe foi presa.

Desde o final da ditadura militar argentina, 1.184 pessoas foram condenadas por crimes relacionados à repressão estatal, e ainda há 62 processos em andamento. No tribunal, Pablo Diaz, sobrevivente da chamada “Noite dos Lápis”, quando a ditadura sequestrou 10 estudantes (dos quais apenas quatro saíram com vida) em 1976, disse que “a justiça e o castigo chegou” aos responsáveis pelas atrocidades.

— Chegou a sentença para todos os responsáveis por nos matar, nos torturar e nos estuprar no Poço de Banfield — afirmou à AFP. Do lado de fora da corte, cerca de 300 pessoas também celebraram as sentenças, e criticaram as recentes declarações do presidente Javier Milei questionando a história e, especialmente, o número de vítimas da repressão dos militares no país. Alguns levavam cartazes dizendo “Foram 30 mil, Foi um Genocídio”.

No domingo, quando o país marcou os 48 anos do início da ditadura, Milei divulgou um vídeo na conta oficial da Casa Rosada questionando fatos estabelecidos e pedindo que haja uma “memória completa” do período, “para que haja verdade e justiça”.

O revisionismo, defendido ainda durante a campanha à Presidência, é atribuído em grande parte à vice de Milei, Victoria Villarruel, filha de um militar que lutou na Guerra das Malvinas (1982) e que defendeu nos tribunais militares acusados de crimes contra a humanidade. Além de usar, no domingo, uma hashtag questionando o número de 30 mil mortos e desaparecidos, na campanha ela chamou as Mães da Praça de Maio, uma das mais conhecidas vozes das vítimas do regime, de “mães de terroristas”.

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