Boric vs. Kast: o futuro em disputa no Chile

Faz pouco mais de dois anos que o Chile surpreendeu o mundo. Naquele fim de 2019, o então país modelo da América Latina se viu envolto, quase de uma hora para outra, em alguns dos maiores protestos de sua história, que começaram contra um aumento de 30 pesos na passagem do metrô em outubro e terminaram levando milhões de chilenos às ruas.

As manifestações – também chamadas de “Revolta de Outubro”, “Primavera chilena” ou “Estallido Social” – só pararam com a pandemia, cinco meses depois. Nos anos que se seguiram, porém, deixaram como herança, de um lado, a aprovação popular para escrever uma nova Constituição e, de outro, uma reorganização completa das forças políticas, da esquerda à direita.

É essa a soma de fatores que culmina neste domingo, 19, em uma disputa presidencial incomum. Após um primeiro turno em que os partidos tradicionais perderam força, concorrem o ultradireitista José Antonio Kast, advogado e deputado de 55 anos, e o esquerdista e também deputado Gabriel Boric, de apenas 35.

Há dois anos, ter essa configuração em um segundo turno pareceria impossível: nos 30 anos de democracia desde o fim da ditadura de Augusto Pinochet (1973-90), se revezaram no poder no Chile grupos de direita ou centro-direita (como o atual presidente Sebastián Piñera) e de centro-esquerda (com nomes como a ex-presidente Michelle Bachelet). Pois nem Kast, nem Boric, vêm dessas coalizões.

“Certamente, é uma eleição sem precedentes no Chile”, resume a cientista política Isabel Castillo, da Escola de Governo da Pontificia Universidad Católica (PUC-Chile) e do Centro de Estudos de Conflito e Coesão Social.

Ex-líder estudantil, Boric defende maiores investimentos sociais e serviços públicos, uma mudança de 360 graus no Estado liberal e de amplo livre mercado construído pelo Chile desde os anos 1980. No espectro oposto, Kast pautou sua campanha em segurança e críticas à imigração crescente, enquanto defende posições que a direita tradicional não endossava abertamente, como elogios à ditadura Pinochet.

A campanha terminou oficialmente no Chile na quinta-feira, 16, e o resultado é incerto. Kast venceu com margem de somente dois pontos (28% dos votos) no primeiro turno em novembro. Já as primeiras pesquisas de segundo turno deram vantagem a Boric, mas Kast tem ganhado terreno e a diferença é muito pequena, de menos de um ponto percentual em algumas sondagens.

Apoiador de Kast durante campanha: candidato tem ganhado força entre eleitores conservadores com promessas de estabilidade

Apoiador de Kast durante campanha: candidato tem ganhado força entre eleitores conservadores com promessas de estabilidade (Claudio Santana/Getty Images)

“Os protestos de 2019 – e a violência que apareceu ao lado de manifestações pacíficas – empurraram muitos chilenos na direção de priorizar a ordem pública. A retórica de Kast conversa com essas demandas”, diz Paul Angelo, pesquisador de estudos latino-americanos no Council on Foreign Relations, think-tank sediado nos Estados Unidos.

“Muitos eleitores não sentiram que os partidos de centro estavam atendendo a suas preferências, ou não rápido o suficiente”, diz.

A insatisfação dos pingüinos

Apesar dos bons números que marcaram a economia do Chile nas últimas décadas, os protestos que explodiram há dois anos não aconteceram de forma totalmente repentina.

A insatisfação com parte do então elogiado modelo econômico chileno já vinha se construindo ao menos desde a década anterior, quando ocorreu a chamada Revolución Pingüina em 2006, liderada por estudantes secundaristas, e grandes protestos universitários em 2011.



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